Série: Arte_Cultura&Sociedade
"Todas as artes
contribuem
para a maior de todas as artes,
a arte de viver."
___Bertolt Brecht
Em tempos conturbados de exaltação da ignorância em diversas instâncias (subjetivas e concretas), incentivo à desinformação, à criação de "otários de cínicos", ao ódio, confusão de fatos e informações para o deslanchar de atos e fatos manipulados e autoritários, supervalorização dos enganos e do que é enganoso e, ainda, numa proposta de "pintar cores de reflexão", abaixo algumas considerações e trechos de didático artigo, de Nora Prado* - texto na íntegra ao final do post - acerca das evoluções humanas, bem como das involuções sociais, e onde a ARTE (e suas manifestações e expressões, em contexto de liberdade ou tentativa de apagamento da mesma) tem caminhado nesses entremeios, ou seja: a partir do próprio Homem ou na representação de cultuada robotização (leia-se: todo plantar tem um colher) e valorização da desumanidade e suas consequências, ao longo dos tempos - inclusive os atuais.
"...Não dá para livrar todo mundo
da sua própria ignorância..."
entretanto...
Quem sabe...
Os que queiram possam perceber e vencer
a ignorância, o preconceito e a prepotência
com ampliação de visão
Percepção
Ampla sobre
Vida
(que nunca pôde ser e nunca será enclausurada definitivamente
apenas por desconhecimento ou convenções de limitação / opressão)
mesmo que...
queiramos ver o mesmo ângulo ano após ano
existem outros...
a ignorância, o preconceito e a prepotência
com ampliação de visão
com real CONHECIMENTO!
Conhecimento de...
História
Memória
(que nunca pôde ser e nunca será enclausurada definitivamente
apenas por desconhecimento ou convenções de limitação / opressão)
Caminhos da ARTE!
E o quanto esses caminhos
nos dizem respeito
mesmo que...
os desconheçamos
mesmo que...
enxerguemos de formas diferentes
mesmo que...
não os entendamos
mesmo que...
queiramos ver o mesmo ângulo ano após ano
existem outros...
 n g u l o s!
Ontem
"Antes de tudo é preciso reconhecer a necessidade da arte como manifestação inerente a qualquer criança e presente desde os tempos mais remotos, quando as comunidades humanas ainda viviam nas cavernas. Os desenhos encontrados nas paredes, de inúmeras delas, testemunham a vida do grupo e a sua relação com a natureza e os animais, além de revelar um olhar apurado, e extremamente sofisticado, nestes desenhos magníficos. Começava a narrativa pictórica, necessária, para estabelecer a própria história e dar sentido aos valores da tribo. A relação com as forças incontroláveis da natureza eram relacionadas com os poderes sobrenaturais e o divino. A música dos tambores e os rituais para as caçadas, fertilidade, nascimento e morte passaram a fazer parte de um conjunto de práticas que auxiliavam na organização e fortalecimento destas comunidades primitivas. Embora esse “fazer artístico”, sequer fosse pensado como arte, era fundamental para dar unidade e identidade aos seus integrantes. Desenhar, modelar, esculpir, naturalmente, começava a fazer parte da vida comunitária onde os conteúdos simbólicos ganhavam materialidade e forma objetiva. Fosse através do barro moldado, da pedra esculpida, dos desenhos ou da música e dança que passavam a integrar a cultura nativa dessas tribos nômades."
Hoje
Século XXI__Ano 2017
"Se em dado momento a arte foi uma projeção da natureza e da figura humana em suas formas e cores mais semelhantes, quase fotográfica, isso se deu de modo a preservar os momentos políticos e sociais como a crônica narrativa da época. Uma forma de eternizar o tempo e recontá-lo para as gerações futuras. Com o advento da fotografia e posteriormente do cinema, essa representação, quase fotográfica, da realidade perdeu sua razão de ser, afinal a câmera fotográfica era capaz de fazer isso melhor e mais rápido. A arte se libertou desse formalismo e pode se aventurar sobre outras possibilidades criativas. Desde então as artes plásticas sofreram uma série de mudanças a partir de tendências que se agrupavam em torno de uma filosofia ou escola específica. Se pensarmos na quantidade de artistas que tiveram sua obra rejeitada pelo gosto social da época, constatamos que essas mesmas obras serão assimiladas com o passar do tempo e o artista será finalmente reconhecido como tal.
...que tipo de arte pode ser produzida nestes tempos de modernidade cínica e sombria? Diante dessa sociedade hipócrita e doentia? É evidente que não será mais a natureza morta com o seu belo vaso de flores. O horror através da arte é mostrado para que possamos sair do estado letárgico e passivo em que nos encontramos. Como possibilidade de oposição e questionamento. Por isso os suportes da tela não são mais suficientes. Criam-se instalações, a arte passa pela rua, entra em novos espaços, inclusive pelo corpo vivo do próprio artista que, em sua nudez primeira, revela a solidão e fragilidade de nossa condição, demasiadamente, humana. Penso que a obra de arte e a função do artista também é de manifestar indignação, provocar revolta, comoção, inquietação e reflexão. A obra de arte sintetiza um inconsciente coletivo que evoca traumas, medos, dores, alegrias e tristezas. A arte propicia esse espaço meditativo para reconhecer a realidade e poder transformá-la. E por isso a ida a museus, teatros, cinemas, espetáculos de música e dança são oportunidades preciosas para entrarmos em contato com a nossa humanidade. Uma maneira de resgatar nossa sensibilidade embotada. A obra de arte contesta e indaga."
...que tipo de arte pode ser produzida nestes tempos de modernidade cínica e sombria? Diante dessa sociedade hipócrita e doentia? É evidente que não será mais a natureza morta com o seu belo vaso de flores. O horror através da arte é mostrado para que possamos sair do estado letárgico e passivo em que nos encontramos. Como possibilidade de oposição e questionamento. Por isso os suportes da tela não são mais suficientes. Criam-se instalações, a arte passa pela rua, entra em novos espaços, inclusive pelo corpo vivo do próprio artista que, em sua nudez primeira, revela a solidão e fragilidade de nossa condição, demasiadamente, humana. Penso que a obra de arte e a função do artista também é de manifestar indignação, provocar revolta, comoção, inquietação e reflexão. A obra de arte sintetiza um inconsciente coletivo que evoca traumas, medos, dores, alegrias e tristezas. A arte propicia esse espaço meditativo para reconhecer a realidade e poder transformá-la. E por isso a ida a museus, teatros, cinemas, espetáculos de música e dança são oportunidades preciosas para entrarmos em contato com a nossa humanidade. Uma maneira de resgatar nossa sensibilidade embotada. A obra de arte contesta e indaga."
No Amanhã
__Seja como for o amanhã
"Os museus guardam as relíquias destas civilizações ancestrais como objeto de apreciação e estudo, para conhecermos os hábitos, os valores e a vida cotidiana destes povos. A filosofia, medicina, ciência e literatura produzida, bem como o desenvolvimento das outras artes como a música, dança, teatro, escultura, pintura e arquitetura nos dão a medida evolutiva dessas civilizações.
Em tempos de cegueira generalizada é fundamental que a arte e o artista reajam. Mas através da arte, que apesar da contundência e intensidade, possui poesia e transcendência, pois dialoga com outros seres humanos atingindo seus corações e mentes."
"Criações Artísticas
ou Obras de Arte
são ou podem ser...
são ou podem ser...
"A Criação de Adão", de Michelângelo -ano: por volta de 1511 |
"Homem Vitruviano" de Leonardo Da Vinci ano 1490 V I S Õ E S |
Os passos, traços,
luz, transformação, expressões,
rabiscos, impressões,
de quem foi, é ou será
HUMANO!
O que está 'à flor da pele'
Nota do Blog ---
**Além de poesia autoral editora do Blog, foram citados trechos do artigo abaixo - Artigo na íntegra:
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Então me pergunto: que tipo de arte pode ser produzida nestes tempos de modernidade cínica e sombria? Diante dessa sociedade hipócrita e doentia? É evidente que não será mais a natureza morta com o seu belo vaso de flores. O horror através da arte é mostrado para que possamos sair do estado letárgico e passivo em que nos encontramos. Como possibilidade de oposição e questionamento. Por isso os suportes da tela não são mais suficientes. Criam-se instalações, a arte passa pela rua, entra em novos espaços, inclusive pelo corpo vivo do próprio artista que, em sua nudez primeira, revela a solidão e fragilidade de nossa condição, demasiadamente, humana. Penso que a obra de arte e a função do artista também é de manifestar indignação, provocar revolta, comoção, inquietação e reflexão. A obra de arte sintetiza um inconsciente coletivo que evoca traumas, medos, dores, alegrias e tristezas. A arte propicia esse espaço meditativo para reconhecer a realidade e poder transformá-la. E por isso a ida a museus, teatros, cinemas, espetáculos de música e dança são oportunidades preciosas para entrarmos em contato com a nossa humanidade. Uma maneira de resgatar nossa sensibilidade embotada. A obra de arte contesta e indaga. E dentre tantos autores, nunca Shakespeare, Kafka e Nélson Rodrigues me pareceram tão modernos, pois seus personagens perversos, solitários, arrogantes, hipócritas, medíocres, covardes, delirantes com seus fantasmas e deformações, continuam oprimindo e enganando alguns heróis que seguem lutando e gritando por justiça e liberdade.
luz, transformação, expressões,
rabiscos, impressões,
de quem foi, é ou será
HUMANO!
Considerações expressas
por diversas linguagens, aspirações, sentidos, emoções
"Davi", de Michelângelo - data 1501-1504 |
Crédito na imagem - Arte Contemporânea |
e o profundo inconsciente
D.A. - Imagem: Google imagens
O querido, o reprimido
Batizado de Macunaíma de Tarsila do Amaral - data 1956 |
A ação lembrada
e a reação dormente
by Peter Gric - Arte contemporânea |
As viagens que estão em nós
e nunca se fizeram presentes
Optical Illusion Art | Megaodd.com Arte contemporânea
Não é...
Degeneração ou apologia a crimes
É expressão, representação
Cores, tintas, versos
Sonho, inspiração, indagação
Um passo à frente ou reverso
Natureza, pés, corpo, mão
by Emilio Gomariz - Arte Contemporânea |
Alguns fatos | Alguns tempos
(vídeo exemplificando alguns acontecimentos na história recente do Homem e das Artes
por através de ORALIDADE / depoimento de quem andou nesses tempos)
por Bemvindo Sequeira (Ator, Autor, Diretor )
Via FanPage Oficial Bemvindo Oficial
A Vida e a Arte estão em toda parte
Em todos os momentos!"
__Valéria Milanes Aluahy
... e a Arte, vencendo um vão entre a população e "a instituição arte", para além dos museus ou canais de "entretenimento", deveria estar mais presente nas periferias, nos recôncavos, nas vielas, nos guetos, nas esquinas, nos escondidos onde é colocada a "parte útil" da sociedade ou ter sua mais real representação no dia a dia do homem /mulher/ todes comum, da/o/e trabalhadora/o/e braçal que não tem direito ao acesso à verdadeira arte,educação e/ou lazer (e demais direitos e necessidades fundamentais), e muito menos ainda à Arte de viver - e nem sabe o porquê.
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Nota do Blog*:
... e a Arte, vencendo um vão entre a população e "a instituição arte", para além dos museus ou canais de "entretenimento", deveria estar mais presente nas periferias, nos recôncavos, nas vielas, nos guetos, nas esquinas, nos escondidos onde é colocada a "parte útil" da sociedade ou ter sua mais real representação no dia a dia do homem /mulher/ todes comum, da/o/e trabalhadora/o/e braçal que não tem direito ao acesso à verdadeira arte,educação e/ou lazer (e demais direitos e necessidades fundamentais), e muito menos ainda à Arte de viver - e nem sabe o porquê.
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__Umberto Eco
"A ciência descreve as coisas como são;
a arte, como são sentidas,
como se sente que são."
__Fernando Pessoa
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Nota do Blog ---
**Além de poesia autoral editora do Blog, foram citados trechos do artigo abaixo - Artigo na íntegra:
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A ARTE COMO NARRATIVA E INTERPRETAÇÃO DO MUNDO –
por Nora Prado
Devido as recentes polêmicas no universo das artes plásticas, no Brasil, com ataques insanos do MBL à exposição Queermuseu, exibida no Santander de Porto Alegre e da performance, La Bête, de Wagner Schwartz, apresentada no MAM de São Paulo, onde funcionários do museu foram agredidos fisicamente, considero oportuno algumas considerações sobre o papel das artes no desenvolvimento social e cultural das civilizações. Uma oportunidade para ampliar o debate sobre a função da arte como alfabeto para apreender e discutir sobre o mundo moderno.
Antes de tudo é preciso reconhecer a necessidade da arte como manifestação inerente a qualquer criança e presente desde os tempos mais remotos, quando as comunidades humanas ainda viviam nas cavernas. Os desenhos encontrados nas paredes, de inúmeras delas, testemunham a vida do grupo e a sua relação com a natureza e os animais, além de revelar um olhar apurado, e extremamente sofisticado, nestes desenhos magníficos. Começava a narrativa pictórica, necessária, para estabelecer a própria história e dar sentido aos valores da tribo. A relação com as forças incontroláveis da natureza eram relacionadas com os poderes sobrenaturais e o divino. A música dos tambores e os rituais para as caçadas, fertilidade, nascimento e morte passaram a fazer parte de um conjunto de práticas que auxiliavam na organização e fortalecimento destas comunidades primitivas. Embora esse “fazer artístico”, sequer fosse pensado como arte, era fundamental para dar unidade e identidade aos seus integrantes. Desenhar, modelar, esculpir, naturalmente, começava a fazer parte da vida comunitária onde os conteúdos simbólicos ganhavam materialidade e forma objetiva. Fosse através do barro moldado, da pedra esculpida, dos desenhos ou da música e dança que passavam a integrar a cultura nativa dessas tribos nômades.
Com o passar do tempo, essas pequenas sociedades puderam se fixar no solo, através da agricultura e da domesticação de alguns animais para alimentação do clã e futuras trocas entre os seus habitantes. Além disso, com a evolução da linguagem e da hierarquia política, os valores éticos se consolidaram e seus pares organizaram-se ao redor de princípios, nos quais, esses homens e mulheres acreditavam. Antes mesmo de existir moeda corrente ou linguagem escrita, essas tribos seguiam com seus ornamentos, rituais, desenhos, esculturas, cantos e danças próprias da sua cultura.
As comunidades evoluíram, bem como o sistema econômico, social e político de cada tribo que terminou por formarem vilas, aldeias e cidades com língua e hábitos comuns. A partir dessas pequenas unidades, não sem guerras, escravidão e derramamento de sangue, surgiram as primeiras civilizações, com a divisão do trabalho e as funções sociais discriminadas. A religião e o sistema de leis, bem como a escrita, foram fundamentais no desenvolvimento da comunicação e expressão. A arte passou a ter lugar de destaque e refletia os valores, hábitos e crenças próprias daquela sociedade. Os artesãos produziam imagens e objetos que valorizavam os deuses, os governantes, a vida doméstica e narravam a história através de novos materiais e técnicas. A cultura e o sistema social, político e religioso da Mesopotâmia, Egito, Pérsia, Grécia, China e Índia podem ser facilmente estudados a partir dos vestígios da arte produzida por estas civilizações. Afinal a arte é o resultado da síntese, da decantação temporal e da estruturação estética através de códigos culturais específicos.
Os museus guardam as relíquias destas civilizações ancestrais como objeto de apreciação e estudo, para conhecermos os hábitos, os valores e a vida cotidiana destes povos. A filosofia, medicina, ciência e literatura produzida, bem como o desenvolvimento das outras artes como a música, dança, teatro, escultura, pintura e arquitetura nos dão a medida evolutiva dessas civilizações. O legado greco-romano foi fundamental para o ocidente, pois a partir dele a Europa se constituiu como gênese dos futuros países que se formariam a partir da Idade Média. Nesse período os pintores e escultores ainda estavam identificados com a figura dos artesãos e das guildas comerciais. Não havia a noção da autoria e da assinatura própria. A ideia do artista, como nós reconhecemos hoje, surge a partir do Renascimento. Com o resgate dos ideais da cultura clássica greco-romana, muito da sua filosofia, política e arte foi retomado, especialmente, no que concerne aos artistas da corte. Leonardo da Vici, Michelangelo, Rafael, Boticelli, Giotto, Caravaggio, Masaccio, entre outros, serão influenciados pela cultura helênica com o predomínio da razão, da invenção, da glorificação do homem e da natureza. Com o surgimento da imprensa a disseminação das ideias através dos jornais e livros impulsionou a comunicação consideravelmente. Além disso, a era das navegações incrementou o comércio e a ciência, possibilitando trocas culturais riquíssimas. Mas a descoberta das Américas com a ocupação europeia destruiu culturas em estágios diferentes de civilização, o que foi lamentável em todos os sentidos. As colônias foram saqueadas e seus proprietários, legítimos, foram dizimados ou escravizados. O tráfego de escravos e o sistema capitalista produziu riquezas e bens, além de muita miséria e desigualdade social no Brasil e em toda a América Latina.
As sociedades seguiram se desenvolvendo bem como os movimentos estéticos através do Barroco, Neoclassicismo, Romantismo, Naturalismo, Realismo, Impressionismo, Simbolismo, Expressionismo, Cubismo, Surrealismo, Modernismo. Enfim, dou um rápido panorama histórico somente para mostrar que em cada momento específico e conforme as forças sociais e culturais da sociedade, uma arte particular foi produzida.
Se em dado momento a arte foi uma projeção da natureza e da figura humana em suas formas e cores mais semelhantes, quase fotográfica, isso se deu de modo a preservar os momentos políticos e sociais como a crônica narrativa da época. Uma forma de eternizar o tempo e recontá-lo para as gerações futuras. Com o advento da fotografia e posteriormente do cinema, essa representação, quase fotográfica, da realidade perdeu sua razão de ser, afinal a câmera fotográfica era capaz de fazer isso melhor e mais rápido. A arte se libertou desse formalismo e pode se aventurar sobre outras possibilidades criativas. Desde então as artes plásticas sofreram uma série de mudanças a partir de tendências que se agrupavam em torno de uma filosofia ou escola específica. Se pensarmos na quantidade de artistas que tiveram sua obra rejeitada pelo gosto social da época, constatamos que essas mesmas obras serão assimiladas com o passar do tempo e o artista será finalmente reconhecido como tal.
Foi assim com o caso, clássico, de Vincent Van Gohg que foi incompreendido e não vendeu, sequer, uma única tela durante a vida e, no entanto, com o passar do tempo sua pintura foi considerada genial e, atualmente, é um dos pintores mais populares do mundo. Suas figuras feitas com pinceladas grossas e cores vivas sem, necessariamente, coincidir com o real foi um choque na época. E, sobre isso, é importante ressaltar que a obra de arte não é a mimetização da vida, mas a sua representação. Uma forma de interpretar o mundo e dar significados diversos à experiência de viver. Nesse sentido a arte parte de uma premissa de liberdade expressiva para existir. O artista tem seu próprio ponto de vista sobre os temas que elege, assim como, os suportes e materiais escolhidos. A arte é uma espécie de mediação da realidade, entre o que o artista vê e sente e aquilo que expressa. Portanto ela não precisa necessariamente ser ou dar a ilusão do real, mas antes sugerir e evocar a realidade. Se no Renascimento muitas pinturas tinham o poder de elevar o espírito, promover a comunhão do espectador e a obra, suscitar piedade e compaixão, ou exaltar a beleza a arte não se resume a estas expectativas.
Se a arte reflete sobre o mundo e diz respeito aos valores cultivados pela sociedade, da qual faz parte, é natural que expresse essa realidade. Ora, vivemos numa sociedade de consumo capitalista e selvagem, na qual o jogo de interesses mina a confiança e a amizade, a competitividade gera estresse e insatisfação, o individualismo e hedonismo alheiam os seres humanos de si mesmos, o desejo é massificado e manipulado pela mídia e a publicidade, há excesso de informação e falta de conhecimento, poluição sonora, visual, além de um abuso dos recursos naturais em prejuízo da qualidade de vida. Os centros urbanos são fábricas de loucos, onde as desigualdades sociais ficam cada vez mais acentuadas, o lazer pasteurizado, os meios de comunicação estandardizados e a incomunicabilidade cada vez maior. As redes sociais e o mundo virtual transformados em arena onde se disseminam ódios e intolerâncias de todos os tipos. As religiões viraram seitas e os fiéis, cegos fanáticos, que matam e destroem em nome de Deus. A manipulação da infância e juventude transformado-os em consumidores sem limites está criando gerações de neuróticos frustrados e pessoas imediatistas. O fracasso das ideologias e a decadência dos valores humanistas abriu uma fissura nos sistemas políticos e desiludiu milhares de pessoas. A corrupção e oportunismo dos partidos políticos e suas medidas absurdas desfiguraram o nosso Brasil. Um conservadorismo galopante que se manifesta com mais prepotência e agressividade em todo mundo. Neonazistas e radicais islâmicos mostram a face cruel e horrenda do radicalismo e da intolerância política e religiosa. Estamos à beira de uma terceira guerra mundial, a mercê das vaidades de Trump e do ditador Kim Jong-Um. Com francos atiradores matando civis em Las Vegas e bandidos do trafico e da polícia civil matando inocentes na Rocinha. Com bispos e padres molestando crianças e toda a sorte de violência e vulgaridade passando na televisão e nos joginhos eletrônicos. Com incendiários matando criancinhas em creches e homofóbicos matando gays indiscriminadamente. Ora, deduzo que estamos morando no inferno.
Então me pergunto: que tipo de arte pode ser produzida nestes tempos de modernidade cínica e sombria? Diante dessa sociedade hipócrita e doentia? É evidente que não será mais a natureza morta com o seu belo vaso de flores. O horror através da arte é mostrado para que possamos sair do estado letárgico e passivo em que nos encontramos. Como possibilidade de oposição e questionamento. Por isso os suportes da tela não são mais suficientes. Criam-se instalações, a arte passa pela rua, entra em novos espaços, inclusive pelo corpo vivo do próprio artista que, em sua nudez primeira, revela a solidão e fragilidade de nossa condição, demasiadamente, humana. Penso que a obra de arte e a função do artista também é de manifestar indignação, provocar revolta, comoção, inquietação e reflexão. A obra de arte sintetiza um inconsciente coletivo que evoca traumas, medos, dores, alegrias e tristezas. A arte propicia esse espaço meditativo para reconhecer a realidade e poder transformá-la. E por isso a ida a museus, teatros, cinemas, espetáculos de música e dança são oportunidades preciosas para entrarmos em contato com a nossa humanidade. Uma maneira de resgatar nossa sensibilidade embotada. A obra de arte contesta e indaga. E dentre tantos autores, nunca Shakespeare, Kafka e Nélson Rodrigues me pareceram tão modernos, pois seus personagens perversos, solitários, arrogantes, hipócritas, medíocres, covardes, delirantes com seus fantasmas e deformações, continuam oprimindo e enganando alguns heróis que seguem lutando e gritando por justiça e liberdade.
Em tempos de ódio generalizado, dentre tantas imagens que escolhi para ilustrar essa crônica, nada me parece mais apropriada do que este Cristo Shiva do artista plástico Fernado Baril. A própria imagem da deturpação de tudo quanto Cristo e Shiva representam. Estão ali desolados, impotentes e a mercê da deformação da sociedade de consumo. E a propósito das hóstias que tantos esbravejaram contra o artista que escreveu vagina e outras palavras, sobre elas, percebo nessa ousadia um ato simbólico mostrando que a verdadeira perversão acontece dentro da igreja. Quando padres e bispos abusam sexualmente de meninos e meninas indefesos, com sua sexualidade reprimida desde a Idade Média. A mesma igreja católica que perseguia, prendia, torturava e queimava bruxas. A mesma TFP que atualmente queima terreiros, destrói templos que não veneram os mesmos Deuses. A mesma Ku Klux Kan que persegue e mata negros. Os mesmo ignorantes covardes que picham o equipamento público do Santander Cultural e os mesmos defensores da moral e dos bons costumes que ofendem e agridem a socos e pontapés os funcionários do MAM.
Em tempos de cegueira generalizada é fundamental que a arte e o artista reajam. Mas através da arte, que apesar da contundência e intensidade, possui poesia e transcendência, pois dialoga com outros seres humanos atingindo seus corações e mentes.
Porto Alegre, 7 de outubro de 2017.
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